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RDC (Congo)

Tshisekedi e Kagame cedem a Trump em acordo Congo–Ruanda

Tshisekedi e Kagame adotam postura de submissão diplomática a Trump no acordo Congo–Ruanda, enquanto a população segue marcada por violência, deslocamentos e crise humanitária.

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O Acordo de Washington, assinado em 27 de junho de 2025 e ratificado em 4 de dezembro de 2025, foi apresentado como um marco histórico nas relações entre República Democrática do Congo (RDC) e Ruanda. Mas, diante dos fatos, a narrativa diplomática contrasta profundamente com a realidade vivida pela população congolesa e se aproxima mais da ambição política de Donald Trump, que tenta se recolocar como protagonista global e mediador de paz.

Créditos: portal UNICEF

A União Africana adotou cautela ao pedir que o acordo seja aplicado “na letra e no espírito”, reconhecendo o histórico de pactos que fracassaram por ausência de implementação. O alerta era necessário: a mesma semana da ratificação do acordo registrou novos deslocamentos forçados no leste da RDC e nenhum avanço nas linhas de frente.

No discurso de 5 de dezembro de 2025, Donald Trump exaltou Félix Tshisekedi e Paul Kagame como “heróis”, afirmando:
“J’ai beaucoup confiance dans les deux dirigeants… Ils respecteront leurs engagements.”
(“Tenho muita confiança nos dois líderes… Eles respeitarão seus compromissos.”)

A fala buscava projetar uma imagem de harmonia e de liderança global compatível com seu desejo frequente de ser visto como candidato natural ao Prêmio Nobel da Paz. Mas o discurso não encontra respaldo no terreno. Na mesma data, organizações humanitárias alertavam para surtos de sarampo, cólera e malária em campos de deslocados superlotados na região de Goma, Rutshuru, Masisi e Nyiragongo.

Segundo a ONU e o ACNUR, mais de 7 milhões de congoleses estavam deslocados internamente ao final de 2025 um dos piores índices do mundo. Famílias caminham por quilômetros levando tudo o que resta em sacos de farinha ou amarrado em pedaços de tecido. Mulheres carregam crianças nas costas enquanto equilibram bidões de água. Escolas e igrejas transformaram-se em abrigos improvisados, com dezenas de pessoas dormindo sobre folhas de bananeira ou pedaços de lona azul.

Nada disso aparece nas fotos das cerimônias internacionais. Mas é esse o cenário em que a “paz histórica” deveria produzir efeitos.

A contradição se torna ainda mais evidente quando Trump abandona o discurso pacifista para revelar o componente econômico central do acordo:
“Nous allons envoyer certaines de nos plus grandes entreprises… extraire certaines des terres rares… Tout le monde va gagner beaucoup d’argent.”
(“Vamos enviar algumas das nossas maiores empresas… extrair terras raras… Todos vão ganhar muito dinheiro.”)

A declaração explicita o que muitos analistas já reconheciam: o acordo abre espaço para exploração de minerais estratégicos cobalt, coltan, terras raras recursos que historicamente alimentam conflitos, desigualdade e violações de direitos humanos na região. A “paz” apresentada como avanço diplomático se mistura a um corredor econômico que favorece interesses externos.

O quadro se complica ainda mais com o processo paralelo mediado pelo Catar, que anunciou um acordo-quadro com o M23 em novembro de 2025, mas sem conteúdo consolidado. Nenhuma medida prática foi implementada. As posições militares continuam ativas, e civis seguem presos entre grupos armados e forças estatais.

O contraste é brutal:

  • enquanto líderes posam em Washington,
  • famílias fogem sob tiros,
  • campos lotam,
  • crianças adoecem,
  • agricultores abandonam suas terras,
  • e aldeias são dissolvidas pela violência.

A assinatura do acordo em junho e a ratificação em dezembro têm valor político mas não modificaram a realidade concreta de milhões de pessoas. O abismo entre diplomacia e vida real permanece profundo.

Trump tenta narrar o evento como um feito histórico, quase redentor. Mas, sem mudanças no terreno, sua retórica se aproxima mais de ambição pessoal do que de compromisso com a paz. A RDC continua enfrentando deslocamentos em massa, epidemias, fome e insegurança numa região que não precisa de discursos, mas de proteção real.

Enquanto isso, o povo segue esperando que a paz seja mais que uma fotografia em Washington.

A Redação Black News Brasil reúne jornalistas e colaboradores comprometidos em informar, contextualizar e ampliar narrativas a partir de uma lente negra.

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